sábado, 26 de maio de 2012

Inescrupulosa Distância



E quando a distância é medida em anos luz, porém a sombra da solidão é contada em horas infinitas? Me sinto só, feito uma estrela encrustada numa galáxia longínqua, ladeada por suas milionésimas companheiras cintilantes, companheiras cuja distância era maior que o alcance de seus raios de resplandecência e pureza. Não é à toa que o universo é composto por gotículas de luz pintalgadas na escuridão, e não por pontos de negro goticulados na brancura. As trevas não passam de um pretexto de Deus pra que um dia eu pudesse brilhar.
Feito estrela, brilhei. Mas a sideral distância do teu brilho ao meu ofuscou toda e qualquer possibilidade de abrasão, abandonando-me na frialdade do desejo, desalentando-te na solidez do impalpável. Sem poder tocar-te, alentei-me no conspurco da carência, varzendo meus fluidos em tua homenagem. Não podendo ter-te, desconsegui-me na saudade daquilo que nunca tive, alimentando a lembrança de coisas que não vivi e que talvez nunca chegue a viver.
Sob a sombra da realidade, no entanto, obrigo-me a admitir que deuses, estrelas e futuros são apenas suposições, bravatas arremessadas ao vento. E eu sei: o vento que te refresca nas tardes de calor é mesmo que me acaricia nas noites de solidão, brisa mensageira que viaja por milhas no intuito de me fazer relembrar do seu cheiro perdido na distância. Distância, inescrupulosa distância, o que esperas de mim se tua única oferta é o vazio? Enfureço-me com as ironias desse destino escrito torto por linhas retas, retas demais para que eu pudesse percorrê-las, torto demais para que eu pudesse endireita-lo.
Mas o que existe entre nós, compreendi por fim, não são caminhos retilíneos, tampouco destinos tortuosos. O que nos resta é caminhar por uma estrada sem margem, sem de onde sair nem aonde chegar. Entreguemos, de bom grado e com paciência, a nossa história nas mãos rudes do acaso, para que um dia nossos passos desbaratados tracem uma trajetória em que nossos caminhos talvez se cruzem. E quando esse dia chegar, aí sim vamos descobrir se o que viveremos juntos será o talvez, o sempre ou o nunca.
Doravante, enquanto o acaso adormece no túmulo dos substantivos inconcretos, vou substantivando os versos escritos na mesma grafia do teu nome, um nome tão comum quanto um amor que nunca se sentiu. Quero que sejas para mim como um beijo distante do qual ainda sinto saudade, mas que carregue nessa saudade a promessa de um reencontro. Afora as promessas, vou jurando a mim mesmo que a vida pode continuar, que os sorrisos ainda podem ser sorridos, que os amores ainda podem ser vividos. E no torpor da esperança, vou segredando meus sentimentos às paredes, minhas mais sinceras e silenciosas companheiras. Pois assim como a tua, minha casa é muito grande para mim. 

3 comentários:

  1. Belo texto - brilho que não ofusca a visão, cheio de distancias que não impedem a aproximação, palavras enchutas mas não ressecadas de estelidade prolixa...parece que vieram de vários lugares e não só do coração, da mente, da alma...outros lugares! Bom abraço

    Deusimar

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  2. Revisando o comentário anterior, escrito sob a adrenalina do impacto do texto do MARCOS PAULO:
    Belo texto - brilho que não ofusca a visão, cheio de distâncias que não impedem a aproximação, palavras enxutas, mas não ressecadas de esterilidade prolixa... Parece que vieram de vários lugares e não só do coração, da mente, da alma... Outros lugares! Bom abraço

    DEUSIMAR

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  3. Lindo texto, mas preocupante.

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