quarta-feira, 20 de julho de 2011

Criptobotânica


Dá-me, singela jardineira, a pureza do cravo alvejado que um dia brotou no soalho da minha vida. Preciso, cara amiga, encontrar outros perfumes; cansei destes liquens que nunca são meus, dessas pétalas viçosas que caem sem pudor, dessa flora toda.  Do meu solo infértil, porém, cresce um pomar alaranjado, sarapintado pelo outono gaiato que nunca tem fim. Meu pomar dá fruta boa, suculenta; meu pomar faz sombra para aqueles que travam as batalhas que os deuses impiedosamente nos cobram. E meu pomar não tem época, dá o ano inteiro.
Vem.  Afaga essa terra que me esculpe no chão, fertiliza esse branco solo de calcário branco, rega o flanco que germina e colha a poupa antes que apodreça. Todo dia me pergunto, por que tua mão calejada não me toca mais? Sinto-me uma semente na campina, esperando sucumbir nas chamas que destroem minha casa para poder finalmente brotar como a árvore de casca grossa que você não conseguirá subir.
E hoje, com teus pés descalços, pisas a semente que me gesta, lavas a terra que me esconde, barras o sol que tanto anseio. A aridez que me acomete se reforça com teus olhos duros e, sem mais, mata-me assim como a tua vontade. Soterrado, então, me calo; desperdiçando meu labor com lágrima, me conformando com o circular da vida.  Ontem eu era flor, hoje eu sou adubo.  

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