sábado, 14 de janeiro de 2012

Enésima Sinfonia


E quando lhe faltam palavras, você grita? Pois eu prefiro cantar. Da sinfonia que escorre pelos meus olhos, porém, não se ouve um único som, nada de acorde ou melodia. Escuta-se, no entanto, temeroso, os esbravejos do silêncio.
Doravante, no meu peito palavras não faltam. A falta consiste, entrementes, em lábios aptos a proclamá-las. Eles não mais existem. Fugiram-me na noite de ontem, ou de anteontem, depois de amanhã ou antes de nunca, não me lembro mais. Beijaram-me pela última vez num outro anoitecer ao qual cada detalhe me recordo. A lua feita em queijo. O verbo feito em carne. O sêmen feito em doçura. O louco feito em loucura.
E o meu canto, sinfônicas águas moribundas, tornam a respingar insólitas nas páginas do caderno já usado, lembrança de um sonho colegial. Lembro-me das risadas sufocadas e das garotas assanhadas, dos joelhos escoriados pela bonança da juventude. Vislumbro com saudade as camisetas alvejadas e os tênis sujos. E sorrio, desaguado, relembrando os banhos de chuva que nunca, jamais, me resfriaram como a tua ausência hoje me resfria.
Agora, no hoje, encharco-me pela frialdade que me engolfa, hora sim, hora também. Mas eu me recuso. Tendo eu de escolher entre o sóbrio e o insano, escolho o inexistente. Ora, pois o último inimigo a ser aniquilado é a morte, assim como a última amiga a ser conquistada é a inexistência.
Sem mais, inexisto no meu próprio existir, alheando-me àquilo que tenho por amor, mas que não tenho para amar. Eis a penúria que me reafirma a cada manhã: conhecer o caminho de tua casa sem me permitir percorrê-lo. Estagnado, então,  me calo, na esperança de que um dia o silêncio fale por mim. 

2 comentários:

  1. Gosto dos seus textos! Venho acompanhando há algum tempo!
    Entretanto lhe sugeriria trocar o layout e as cores do seu blog que atrapalham a leitura. Depois que leio seu blog fico vendo tudo piscando.
    =)

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  2. um texto colorido num blog em branco e preto. Gostei.

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