sexta-feira, 29 de julho de 2011

Carta de Dioniso aos Tessalonicenses


A vida é só um suspiro do abiótico. Um suspiro caótico que de um ângulo ótico nos observa sem pestanejar. Quando vem a noite o suspiro se esfacela no macaquear do subconsciente e nos nina, feito algodão que guarda a semente escura, feito a semente escura que se guarda no algodão. Num quasar matemático, os fios da vida que as moiras teceram se embaraçaram numa equação de segundo grau e Zeus as castigou sem se apiedar.
O embaraço sou eu. A moita acetinada que Pitágoras não conseguiu desatinar. O peteco da alvorada dos mortos. O garrancho da aurora dos vivos. Pois quando o fio faleceu sobre os meus pentelhos senti a fúria que só mesmo eu poderia sentir, só mesmo eu poderia domar. O nó que me laça é cego como os olhos que eu nunca tive; ainda assim, veio um Jesus que cuspiu na minha poeira e emoldurou as minhas pestanas com seu barro milagroso.
Ó Zeus de Nazaré! O nó se desfez e eu enxerguei o azul da terra e o vermelho do céu! Milagre: eu estava mais cego e mais atado do que antes.
Descobri que o algodão que envolvia minha semente não era tão macio. Descobri que a semente embalada no meu algodão não era assim tão lustrosa. E então, ao tocar a manivela do descaroçador de almas, contemplei o fio da vida se romper pela primeira e última vez.
Ah! Fiapo ordinário! Foste embora e agora me deixastes trepar com os burricos mansos do meu presépio espartano. Ao longe, vi Maria fiando um novo fio de morte. Ao perto, vi as moiras limpando chagas que já foram curadas. Netuno e Noé me banharam e sussurraram ao meu ouvido, dizendo que o destino a Zeus pertence. Foda-se, gritei. Vá as favas com o destino, pois o Olimpo me serve de quintal e o purgatório me serve de motel. Hoje vou me afogar no rio Jordão e só acordarei quando toda aquela água estiver transformada em vinho; e não quero saber de pombas brancas voando sobre mim desta vez, elas fedem. E tenho dito! 

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