Sinto falta dos amigos, daqueles que um dia foram
rotina. Das piadas, das injúrias, da chateação. Das segundas-feiras sóbrias e arrastadas,
recheadas de vagas conversas arremessadas ao vento. Talvez não ao vento, mas ao
abismo que se forma quando uma alma se encosta em outra. E por mais que almas
não existam, às vezes faz bem acreditar que sim. É bonito pensar que nem tudo
são átomos, assim como nem tudo são flores.
Sinto saudade das flores, daquelas que um dia
admirei com carinho, que cheirei com fé. Daquelas que nunca ofereci aos amigos,
nem a Deus, nem a ninguém. É duro
imaginar que hoje a brisa se tornou incapaz de me trazer o alento que na
infância trazia, e que, por mais que eu tente, não há pétala ou espinho que me
faça desabrochar para o sol, não há luz que me faça olhar para o céu, não há
chão que me faça ajoelhar ao sagrado.
É tão bonito ver nos rostos viçosos a vibração de
um espírito que ainda crê na esperança, e que faz dela um agasalho para a vida
e um uma venda para os olhos da razão. Muitas vezes me pergunto por que razão
me presto ao desserviço da vida. Me debato quanto ao cerne do que tenho por
amor e vejo que o que me resta para fazer de troféu são os saudosos amigos,
aqueles que um dia foram rotina.
Até mesmo da rotina me recordo com saudade, pois,
mesmo sem me arrancar suspiros, me toca profundo quando lembro do alvorecer acinzentado
que me guindava da cama para um mundo cheio de tédio, de monotonia. Bela era a
monotonia, entorpecida pelo descaso, cíclica como a vida que a morte faz
questão de nos esfregar na cara.
E por mais que a vergonha ou o pudor nunca tenham
me perpassado a face, é com receio que vejo o caminho daqueles que amo rumando
a lugares que o meu não irá. De longe observo passos que são dados rumo às
escuridões que tempesteiam longe dos meus olhos, mas que ainda assim sufocam
meu coração. Vejo um futuro vazio e um passado poluído demais para ser contado
em palavras. Mas o passado ainda me comove, pois sinto falta dos amigos,
daqueles que um dia foram rotina.